terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Invernos


E em seu caminhar mergulhava em seus mais íntimos e profundos pensamentos. Lembrava da sua infância, de como sua família era ausente. Das tardes de domigo que passava apenas com seu cachorro em torno de um lago, remoendo livros de fantasia, estas que nunca sairiam do papel. Lembrava-se também das manhãs em que pintava quadros em aquarela, que escorria pelo chão, tingindo aqueles raios cinzentos que desciam pela janela e penetravam em seu coração. O tempo foi passando e sua vida continuava sempre a mesma, monótona, vazia. Quando deitava-se em seu jardim congelado ao olhar para o céu monocromático, lembrava de seu vaziu. A cada passo que se afundava na neve ela pensava em um de seus invernos. Além das montanhas havia uma esperança, um rastro do sol que coloria a paisagem, mas além das montanhas é longe, são muitos passos e muitos invernos; o que o ser humano não consegue suportar. Já estava sozinha, sem a família que não lhe fazia falta, sem seu cachorro companheiro de tardes inúteis, sem aquela vontade de vencer que a acompanhava quando jovem. Ela estava lá, em mais um de seus invernos, caminhando sozinha no gelo, sentindo a brisa cortar-lhe a face e as lembranças, o coração.

(Carlos A. T. Rossignolo)

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